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08/12/2010

Meditação sobre a solenidade da Imaculada Conceição de Maria Santíssima.


De Frascisco Fernández Carvajal.


Esta festa, instituída por Pio IX, teve por motivo a proclamação do dogma, no dia 8 de dezembro de 1854. A definição dogmática tornou mais preciso o sentido desta verdade de fé e afirmou de modo solene a fé constante da Igreja. A festividade começou a ser celebrada no Oriente no século VIII e, um século depois, em muitos lugares do Ocidente.

I. TRANSBORDO DE ALEGRIA no Senhor e a minha alma exulta no meu Deus, pois Ele revestiu-me de justiça e envolveu-me no manto da salvação, como uma noiva ornada com as suas jóias1. São palavras que a liturgia coloca nos lábios de Nossa Senhora nesta Solenidade, e que expressam o cumprimento da antiga profecia de Isaías.

Tudo o que de formoso e belo se pode dizer de uma criatura, cantamo-lo hoje à nossa Mãe do Céu. “Exulte hoje toda a criação e estremeça de júbilo a natureza. Alegre-se o céu na alturas e as nuvens espalhem a justiça. Destilem os montes doçuras de mel e júbilo as colinas, porque o Senhor teve misericórdia do seu povo e suscitou-nos um poderoso salvador na casa de David, seu servo, quer dizer, nesta imaculadíssima e puríssima Virgem, por quem chegam a saúde e a esperança dos povos”2, canta um antigo Padre da Igreja.

No seu propósito de salvar a humanidade, a Santíssima Trindade determinou que Maria seria escolhida como Mãe do Filho de Deus feito homem. Mais ainda: Deus quis que Maria se unisse por um só vínculo indissolúvel, não só ao nascimento humano e terreno do Verbo, mas também a toda a obra da Redenção que Ele levaria a cabo. No plano salvífico de Deus, Maria está sempre unida a Jesus, perfeito Deus e homem perfeito, único Mediador e Redentor do gênero humano. “Foi predestinada desde a eternidade, juntamente com a Encarnação do Verbo divino, como Mãe de Deus, por desígnio da Providência divina”3.

Por esta escolha admirável e totalmente singular, Maria, desde o primeiro instante da sua existência, ficou associada ao seu Filho na Redenção da humanidade. Ela é a mulher de que fala o Gênesis na primeira Leitura da Missa4. Depois do pecado original, Deus disse à serpente: Porei inimizades entre ti e a mulher, e entre a tua posteridade e a dela. Maria é a nova Eva, de quem nascerá uma nova linhagem, que é a Igreja. Em virtude dessa escolha, a Santíssima Virgem recebeu uma plenitude de graça maior do que a que se concedeu a todos os anjos e santos juntos; encontra-se numa posição singular e única entre Deus e as criaturas. Ela é quem ocupa na Igreja o lugar mais alto e mais próximo de nós5; é o modelo perfeito da Igreja6 e de todas as virtudes7, Aquela a quem devemos contemplar no nosso esforço por ser melhores. O seu poder salvador e santificador é tão grande que, por graça de Cristo, quanto mais se difunde a sua devoção, mais Ela atrai os fiéis para Cristo e para o Pai8.

Na Virgem puríssima, resplandecente, fixamos os nossos olhos, “como a Estrela que nos guia pelo céu escuro das expectativas e incertezas humanas, especialmente neste dia em que, sobre o fundo da liturgia do Advento, brilha esta solenidade anual da tua Imaculada Conceição e te contemplamos na eterna economia divina como a Porta aberta através da qual deve vir o Redentor do mundo”9.

II. AVE, CHEIA DE GRAÇA, o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres10.

Por uma graça singular, e em atenção aos méritos de Cristo, Santa Maria foi preservada imune de toda a mancha de pecado original, desde o primeiro instante da sua concepção. Deus “amou-a com um amor tão grande, tão acima do amor a toda a criatura, que se comprazeu nEla com singularíssima benevolência. Por isso, cumulou-a tão maravilhosamente da abundância de todos os seus dons celestiais, tirados dos tesouros da sua divindade, muito acima de todos os anjos e santos, que Ela, absolutamente sempre livre de toda a mancha de pecado, e toda formosa e perfeita, manifestou tal plenitude de inocência e santidade que não se concebe de modo algum outra maior depois de Deus nem ninguém a pode imaginar fora de Deus”11.

Esta preservação do pecado em Nossa Senhora é, em primeiro lugar, plenitude de graça totalmente singular e qualificada; a graça em Maria – ensinam os teólogos – suplantou a natureza. NEla tudo voltou a ter o seu sentido primigênio e a perfeita harmonia querida por Deus. O dom pelo qual esteve isenta de toda a mancha foi-lhe concedido como preservação de algo que não se contrai. Livre de todo o pecado atual, não teve nenhuma imperfeição – nem moral nem natural –, não teve nenhuma inclinação desordenada nem pôde ser assaltada por verdadeiras tentações internas; não teve paixões descontroladas; não sofreu os efeitos da concupiscência. Jamais esteve sujeita ao demônio em coisa alguma.

A Redenção também alcançou Maria, pois Ela recebeu todas as graças em previsão dos méritos de Cristo. Deus preparou Aquela que ia ser a Mãe do seu Filho com todo o seu Amor infinito. “Como nos teríamos comportado se tivéssemos podido escolher a nossa mãe? Penso que teríamos escolhido a que temos, cumulando-a de todas as graças. Foi o que Cristo fez, pois, sendo Onipotente, Sapientíssimo e o próprio Amor (1 Jo 4, 8), o seu poder realizou todo o seu querer”12.

No dia de hoje, podemos já divisar a proximidade do Natal. A Igreja quis que as duas festas estivessem próximas uma da outra. “Do mesmo modo que o primeiro rebento indica a chegada da primavera num mundo gelado e que parece morto, assim num mundo manchado pelo pecado e quase sem esperança, essa Conceição sem mancha anuncia a restauração da inocência do homem. Assim como o rebento nos dá uma promessa certa da flor que dele brotará, a Imaculada Conceição nos dá a promessa infalível do nascimento virginal [...]. Ainda era inverno em todo o mundo que rodeava a Virgem, exceto no lar tranqüilo onde Santa Ana deu à luz uma menina. Ali tinha começado já a primavera”13. A nova Vida iniciou-se em Nossa Senhora no mesmo instante em que foi concebida sem mancha e cheia de graça.

III. TOTA PULCHRA ES, Maria, és toda formosa, Maria, e não há mancha alguma de pecado em Ti.

A Virgem Imaculada será sempre o ideal que devemos imitar, pois é modelo de santidade na vida ordinária, nas coisas correntes que compõem também a nossa vida. Mas, para imitá-la, temos de relacionar-nos mais assídua e intimamente com Ela. Não podemos deixá-la após estes dias da Novena, sobretudo porque Ela não nos deixa.

Temos de continuar a cumprir a profecia que a Virgem fez um dia – todas as gerações me chamarão bem-aventurada14 – e que se cumpriu ao pé da letra através de todos os séculos. No campo e na cidade, nos cumes das montanhas, nas fábricas e nos caminhos, em situações de dor e de alegria, em momentos transcendentais (quantos milhões de cristãos não morreram com o doce nome de Maria nos seus lábios ou nos seus pensamentos!), sempre se invocou e se invoca a nossa Mãe. Em tantas e tão diversas ocasiões, milhares de vozes, em diversas línguas, têm cantado louvores à Mãe de Deus ou têm-lhe pedido que olhe com misericórdia para os seus filhos necessitados. É um clamor imenso que brota desta humanidade dorida, em direção à Mãe de Deus, um clamor que atrai a misericórdia do Senhor. A nossa oração nestes dias de preparação para a grande solenidade de hoje uniu-se a tantas vozes que louvam e pedem a Nossa Senhora.

Sem dúvida, foi o Espírito Santo quem ensinou, em todas as épocas, que é mais fácil chegar ao Coração do Senhor por meio de Maria. Por isso, temos de fazer o propósito de buscar sempre um trato muito íntimo com a Virgem, de caminhar por esse atalho para chegarmos antes a Cristo: “Conservai zelosamente esse terno e confiado amor à Virgem – anima-nos o Sumo Pontífice –. Não o deixeis esfriar nunca [...]. Sede fiéis aos exercícios de piedade mariana tradicionais na Igreja: a oração do Angelus, o mês de Maria e, de modo muito especial, o Rosário”15.

Maria, cheia de graça e de esplendor, bendita entre as mulheres, é também nossa Mãe. Uma manifestação de amor a Nossa Senhora é trazer uma imagem sua na carteira ou no bolso; é multiplicar discretamente os seus retratos ao nosso redor, nos quartos da casa, no carro, no escritório ou lugar de trabalho. Parecer-nos-á natural invocá-la, ainda que seja sem palavras.

Se cumprirmos o nosso propósito de recorrer com mais freqüência à Virgem, desde o dia de hoje, verificaremos que “Nossa Senhora é descanso para os que trabalham, consolo dos que choram, remédio para os enfermos, porto para os que encontram no meio da tempestade, perdão para os pecadores, doce alívio dos tristes, socorro para os que rezam”16.

(1) Is 61, 10; Antífona de entrada da Missa do dia 8 de dezembro; (2) Santo André de Creta, Homilia I na Natividade da Santíssima Mãe de Deus; (3) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 61; (4) Gên 3, 9-15; 20; (5) cfr. Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 54; (6) ib., 63; (7) ib., 65; (8) ib., 65; (9) João Paulo II, Alocução, 8-XII-1982; (10) Lc 1, 28; Evangelho da Missa do dia 8 de dezembro; (11) Pio IX, Bula Ineffabilis Deus, 8-XII-1854; (12) Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 171; (13) R. A. Knox, Tiempos y fiestas del año litúrgico, pág. 298; (14) cfr. Lc 2, 48; (15) João Paulo II, Homilia, 12-X-1980; (16) São João Damasceno, Homilia na Dormição da B. Virgem Maria.


Fonte: Hablar com Dios