Quando se faz a leitura atenciosa da bula de uma das muitas pílulas do dia seguinte, à venda livremente nas farmácias brasileiras, vamos nos surpreender com a advertência de que tal medicamento não pode ser usado na presença de uma gravidez, e mais surpresos ainda ficamos quando constatamos que tal advertência aparece oito vezes no texto.Esta hipocrisia, que não deixa de ter seu aspecto jocoso, não tem nada a ver com o bem estar e a saúde das mulheres; trata-se, simplesmente, de um recurso que os grandes laboratórios utilizam para fugir de pendências jurídicas ou processos indenizatórios.
.Quando uma mulher faz uso desses dois comprimidos, na maioria das vezes o Levonorgestrel (derivado da 19-nortestosterona), e em dosagens que equivalem de 7 a 11 comprimidos das pílulas comuns de uso diário, pode-se resumir em dois tipos de ocorrências:
.- No primeiro caso, a mulher está fora do período fértil e portanto não ficará grávida; terá uma modificação no seu ciclo e, após alguns dias ocorrerá um sangramento, tipo menstrual, mas variável, além de eventuais efeitos colaterais, às vezes bastante desagradáveis. Quando o assunto "complicações" é tratado nessa bula, as palavras "morte" e "morrer" aparecem três vezes. Uso inútil do medicamento, já que seu interesse maior era livrar-se de uma possível gravidez que nunca existiu.- Já no segundo caso, a mulher realizou um ato genital no período fértil que, surpreendentemente, em pleno século XXI, a maioria desconhece, e vai ficar grávida.Sabe-se que, logo após o ato genital, a entrada dos espermatozóides no colo do útero, com a presença do muco cervical, é muito rápida. Segundo Speroff e colaboradores, 90 segundos após a ejaculação, já se pode encontrar os gametas masculinos no endocérvice (porção interna do colo uterino).
Estudos feitos, em casos de esterilidade conjugal, mostram que 5 minutos após a inseminação, feita no interior da cavidade uterina, já se detecta espermatozóides nas trompas, na região onde vai ocorrer a fecundação. Portanto, alguns minutos após o orgasmo masculino, já é possível a presença dos gametas do macho em volta do óvulo.Assim, ao ingerir os dois comprimidos, horas ou mesmo um ou dois dias após o ato genital, já existe uma gravidez em desenvolvimento.
Em virtude das altas doses desse hormônio sintético que o medicamento contém, as alterações nas gonadotrofinas hipofisárias, a interrupção do desenvolvimento do folículo ovariano, as alterações tubárias e outras, mas, principalmente, pela descamação endometrial que vai ocorrer, justamente no local onde se implanta a nova vida, esta será fatalmente eliminada, junto com o sangue menstrual.Claro que, também aqui, os efeitos colaterais irão se repetir.
Esta é a inequívoca ação abortiva da pílula do dia seguinte, e da qual a esperteza comercial, a irresponsabilidade pública e a banalização do ato genital farão um sucesso de vendas nos próximos anos, especialmente entre as adolescentes.
Mais uma vez, a sociedade machista, que aí está, libera o homem de sua responsabilidade, pela violência que continuará cometendo contra a mulher.
Dr. Eurico Alonço Malagodi (médico, autor do livro "Mulher, o último elo")
POSTADO ORIGINALMENTE NO BLOG DO PROF. FELIPE AQUINO